A requerente recorreu da sentença de primeira instância, que concedeu parcialmente o pedido para alterar apenas o prenome.
Em
processo sob a relatoria do desembargador Antonio Guerreiro Junior, a
2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) reformou
decisão da Justiça de 1º grau e julgou procedente pedido de uma
transexual do Maranhão, determinando que o cartório de registro civil
proceda a alteração do seu prenome e do gênero de masculino para
feminino, independentemente da realização de cirurgia de redesignação
sexual.

Guerreiro
Junior afirmou que cabe ao julgador analisar as relações sociais, tendo
como norte a dignidade da pessoa humana (Foto: Ribamar Pinheiro)
A
requerente recorreu da sentença de primeira instância, que concedeu
parcialmente o pedido para alterar apenas o prenome, não tendo deferido a
alteração do gênero em razão de não ter havido cirurgia de
transgenitalização.
A mulher relatou ter nascido no ano de 1990,
no interior do Maranhão, onde foi registrada com nome e designação
masculinos. Argumentou que, desde os oito anos de idade, não se
identificava com o sexo masculino, sentindo-se diferente dos meninos de
sua idade. A partir dos 13 anos, passou a vestir-se normalmente como
mulher, fazendo uso do seu nome social.
Afirmou que pediu a
alteração do seu prenome em razão das diversas discriminações e
dificuldades sofridas nos locais públicos que frequenta, a fim de que
possa identificar-se civilmente conforme a aparência e a identidade de
gênero que manifesta. Sustentou ainda que a cirurgia não pode ser uma
condição imposta para a alteração de gênero, já que não é uma conclusão
natural do processo de transexualização, podendo ser ou não desejada
pela pessoa transexual, pois apresenta riscos e caráter mutilatório.
O
relator do recurso, desembargador Antonio Guerreiro Junior, observou
que, ainda que o ordenamento jurídico não forneça uma resposta pronta no
primeiro momento, cabe ao julgador analisar as relações sociais e as
implicações delas entre pessoas, tendo como norte a dignidade da pessoa
humana, um conceito de família plural, democrático e igualitário,
surgindo uma nova interpretação constitucional para atender às mais
diversas situações.
“Neste cenário, as minorias não encontram uma
solução que regule a situação vivida, que batem as portas da Justiça
gerando a verdadeira judicialização da vida”, afirmou.
Guerreiro
Junior observou que casos do tipo tornam necessária a
interdisciplinaridade com outras ciências para assimilação de conceitos
como sexo, identidade de gênero e orientação sexual. O desembargador
relatou diversos estudos e julgados que tratam da transexualidade,
inclusive sobre as dificuldades de atendimento médico enfrentadas por
travestis e transexuais.
“A cirurgia de adequação sexual se revela
inviável para a maioria dos transexuais, que costumam ter pouco apoio
familiar e sofrem com discriminação na comunidade em que vivem”, frisou.
O
magistrado enumerou diversas normas internacionais que desvinculam o
reconhecimento da identidade de gênero do procedimento cirúrgico. Para
Guerreiro Junior, a não realização da cirurgia não pode ser um entrave à
alteração do gênero, por afrontar a dignidade humana e o direito de
todos ao reconhecimento perante a lei.
“Não pode o Estado
imiscuir-se no âmbito da vida íntima da pessoa transexual, impondo-lhe a
realização de uma cirurgia que poderá trazer prejuízos incalculáveis à
sua saúde, à sua fertilidade e à sua dignidade”, avaliou.
O
relator destacou ainda que a permanência do sexo diverso ao que o nome e
aparência remetem estaria a constranger a pessoa, devendo sua
identificação harmonizar-se com sua identidade.
“É inegável que a
apelante se vê como uma mulher, comporta-se como uma mulher,
identifica-se socialmente como uma mulher (inclusive nas redes sociais),
ou seja, seu gênero é feminino, sobrepondo-se ao seu sexo biológico, à
sua genitália e à sua configuração genética”, assinalou.
O
entendimento foi acompanhado pelos desembargadores Marcelo Carvalho e
Nelma Sarney, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça
(PGJ).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.