Em meio à polêmica sobre o uso da hidroxicloroquina para tratar pacientes com coronavírus, a OMS (Organização Mundial da Saúde) decidiu suspender os estudos com a droga.
Segundo a organização, o objetivo é reavaliar sua segurança antes de retomar as pesquisas. A decisão ocorre depois de a revista científica Lancet ter publicado pesquisa com 96 mil pessoas internadas com coronavírus em 671 hospitais de seis continentes mostrando que o uso de hidroxicloroquina e cloroquina estava ligado a um risco maior de arritmia e de morte.
Cientistas de universidades como Harvard (EUA) e Heart Center (Suíça), responsáveis pelo estudo, também constataram que não houve benefício no uso das drogas após o diagnóstico de covid-19. Nos últimos dois meses, a OMS vem coordenando o estudo internacional Solidarity em 18 países para avaliar a segurança e a eficácia de diferentes drogas para combater o coronavírus.
Além de hidroxicloroquina, medicamentos como cloroquina, remdesivir, lopinavir com ritonavir e essas duas drogas combinadas com interferon beta-1a estão sendo testados. De acordo com a cientista-chefe da OMS, Soumya Swaminathan, a suspensão dos estudos sobre a hidroxicloroquina foi feito por precaução, devido ao fato de o estudo da Lancet ter sido feito com um número expressivo de pacientes e após questionamentos feitos por agências de saúde de vários países.
Segundo ela, será feita uma revisão e o conselho do Solidarity, formado por dez dos países participantes (o Brasil não faz parte da lista) vai decidir, nas próximas duas semanas, se retoma ou não os estudos com a droga. Seja qual for o resultado, a OMS diz que, por enquanto, cloroquina e hidroxicloroquina só devem ser usadas em experimentos, em hospitais e sob supervisão médica.
Brasil Apesar da decisão da OMS, no Brasil, o Ministério da Saúde informou que vai manter as orientações que ampliam o uso da cloroquina. Na semana passada, o órgão, após determinação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), alterou o protocolo vigente para permitir que o medicamento seja usado também por pacientes com sintomas leves do novo coronavírus. Até então, seu uso era restrito a pacientes graves e críticos e com monitoramento em hospitais.
"Estamos muito tranquilos e serenos em relação a nossa orientação", disse ontem Mayra Pinheiro, secretária de gestão em trabalho na saúde e coordenadora da elaboração do documento. Segundo Pinheiro, "ela (orientação do Ministério da Saúde) segue uma orientação feita pelo Conselho Federal de Medicina que dá autonomia para que os médicos possam prescrever essa medicação para os pacientes que assim desejarem. Isso é o que vamos repetir diariamente. Estamos muito tranquilos a despeito de qualquer entidade internacional cancelar seus estudos com a medicação, estudos de segurança", afirmou. "Não haverá qualquer modificação na nota que foi feita."
Pinheiro também afirmou que o estudo da Lancet, na qual a OMS se baseou para tomar sua decisão, "não se trata de ensaio clínico, é apenas um banco de dados coletado de vários países. Isso não entra como critério para servir como referência", disse. "Não é metodologicamente aceitável para servir como referência a nenhum país do mundo."
"Nesses estudos, a forma de seleção dos pacientes, onde não havia uma dose padrão, uma duração padrão e medicação padrão para que possa ser considerado como ensaio clínico, nos faz refutar qualquer possibilidade de usar como referência para o Brasil recuar na sua orientação", acrescentou. Pinheiro destacou ainda que a decisão do Ministério da Saúde segue princípios de autonomia para pacientes. Mas ressalvou que o órgão pode rever sua posição se houver novos resultados de estudos.
"Estamos conduzindo pesquisas, e o próprio ministério ajudará na condução de ensaios clínicos. E se constatarmos que não há uma comprovação, podemos recuar da nossa nota", disse. Além de Bolsonaro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, também é um ferrenho defensor da hidroxicloroquina e chegou a dizer que tomava uma dose diária do medicamento como forma de prevenção. No entanto, declarou depois que deixaria de fazer uso da droga.
O estudo publicado na Lancet é um dos maiores já publicados. As descobertas são semelhantes a de outras pesquisas divulgadas nas revistas médicas BMJ, Jama e New England Journal of Medicine. Todas não apontaram benefício e mostraram possíveis danos no uso desse medicamento.
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