Grupo do setor de transporte importou o imunizante da Pfizer e, violando a lei, não fez a doação para o SUS e vacinou familiares a 600 reais pelas duas doses
O ex-senador Clésio Andrade, ex-presidente da Confederação Nacional do Transporte (CNT), foi um dos agraciados. “Estou com 69 anos, minha vacinação [pelo SUS] seria na semana que vem, eu nem precisava, mas tomei. Fui convidado, foi gratuito para mim”, disse ele à piauí. Uma fonte familiarizada com o caso disse à revista que a vacina era da Pfizer, mas o laboratório nega que tenha vendido seu imunizante no Brasil “fora do âmbito do programa nacional de imunização”.
Segundo pessoas que se vacinaram na ocasião, os organizadores foram os irmãos Rômulo e Robson Lessa, donos da viação Saritur. Uma garagem de uma empresa do grupo foi improvisada como posto de vacinação. A piauí telefonou e mandou mensagem para Rômulo Lessa, que não respondeu.
O Congresso aprovou há cerca de vinte dias um projeto de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que autoriza a compra de vacinas pela iniciativa privada, mas determina que todas as doses devem ser doadas ao SUS até que os grupos de risco – 77,2 milhões de pessoas, de acordo com o Ministério da Saúde – tenham sido plenamente imunizados em todo o país. O Brasil vacinou menos de 15 milhões de pessoas até agora.
Mesmo depois da imunização dos grupos prioritários, as vacinas compradas pela iniciativa privada devem ser divididas meio a meio com o SUS, numa operação fiscalizada pela pasta. O Ministério da Saúde enviou uma nota na qual diz que “as doses contratadas pela pasta da Pfizer/BionTech ainda não chegaram ao Brasil. A previsão do laboratório é entregar a primeira remessa a partir de abril ao Programa Nacional de Imunizações (PNI) – que é a base da vacinação de todos os brasileiros contra a Covid-19”.
O deputado estadual de Minas Alencar da Silveira (PDT) também foi vacinado, segundo relatos de pessoas presentes. Silveira contou às pessoas que estavam no local da vacinação que já tinha tido Covid, mas que seu médico autorizara que se imunizasse. À piauí, Silveira confirmou que já tinha sido infectado pelo novo coronavírus, mas negou que tivesse participado da imunização paralela. “Não estou sabendo, não. Até gostaria, mas estou com coronavírus, nem posso”, afirmou.
De acordo com relatos, o grupo foi vacinado por uma enfermeira que se atrasou porque estava imunizando outro grupo na Belgo Mineira, mineradora hoje pertencente à ArcellorMittal Aços. Em nota, a ArcelorMittal afirmou que nunca comprou nenhuma vacina para o combate da Covid-19 da Pfizer ou de qualquer outra empresa farmacêutica. “A empresa nunca fez nenhum contato com a Pfizer ou qualquer outra empresa do setor farmacêutico para compra direta de vacinas contra o coronavírus. A Abertta Saúde, empresa de gestão de saúde da ArcelorMittal, atua como posto avançado de vacinação do SUS junto às Secretarias Municipais de Saúde de Belo Horizonte e de Contagem. No entanto, a ArcelorMittal desconhece qualquer atuação de seus profissionais em atos correlacionados à vacinação fora dos protocolos do Ministério da Saúde e do Programa Nacional de Imunização – PNI.”
Em nota, a Pfizer disse que “nega qualquer venda ou distribuição de sua vacina contra a COVID-19 no Brasil fora do âmbito do Programa Nacional de Imunização. O imunizante COMIRNATY ainda não está disponível em território brasileiro. A Pfizer e a BioNTech fecharam um acordo com o Ministério da Saúde contemplando o fornecimento de 100 milhões de doses da vacina contra a COVID-19 ao longo de 2021”.
Após a publicação da reportagem, o deputado estadual João Vítor Xavier (Cidadania), presidente da CPI dos Fura-Filas da Vacina na Assembleia de Minas, afirmou que, na quinta-feira, vai “ouvir Ministério Público, corregedoria e ouvidoria do governo”. O objetivo é averiguar se a CPI tem competência para investigar o caso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.